ALDRED, Cyril. Os Egípcios. Lisboa: Verbo. 1966

Paula Mariana Morandi

Resenha:
O autor como ele mesmo cita ao longo do livro, tem por objetivo esboçar, em linhas gerais, a história cultural do Egito Antigo, focando principalmente a sociedade e o meio que habitavam e como sobreviviam.

Os primeiros egiptólogos foram os próprios egípcios, pois deixaram incontáveis memórias em seus templos, como a narrativa de Heródoto, onde fez observações importantíssimas sobre o cotidiano egípcio. E a principal nação que deu início aos estudos de egiptologia foi a França em 1798. Mas, a obtenção desses artigos se tornou uma espécie de competição entre as nações, os britânicos se apossaram da Pedra de Roseta, e a partir, os museus europeus se encheram de artigos egípcios.

Em 1854, um funcionário do Museu de Louvre foi enviado ao Egito para uma expedição, e encontrou artigos que incrementaram e muito o museu, mas ele foi nomeado como conservador dos Monumentos do Cairo, e o resto de sua vida ficou se dedicando às escavassões.

O Egito tinha um solo muito favorável e fértil, principalmente em virtude das cheias do Nilo, mas não era apenas de agricultura que se baseava a economia, mas embora nunca encontrados faziam uso de couro de cabra, como peças de vestuário, além da pele utilizavam o leite, tirando dele o queijo e a manteiga, criavam também gansos, obtendo ovos, carne e gordura, e os gansos juntamente com gatos, perus e cães eram criados como animais de estimação. O Egito tinha falta de uma boa madeira para as suas construções, que na falta dela, faziam uso de juncos e canas.

No Antigo Período pré-histórico a comida era aparentemente abundante, cães cabras, carneiros, gado vacum, gansos haviam sido domesticados. No Último período pré-histórico, os instrumentos de caça se tornaram mais comuns, houve uma primeira tentativa para um sistema pictográfico de escrita, contatos comerciais se intensificaram. As cidades-estados do delta eram mais avançadas.

O primeiro florescimento durante o Império Antigo, ficou marcado pelas inovações das construções, com a introdução do tijolo de adobe e de madeiras importadas, e no Período Arcaico a pedra começou a ser utilizada, e desenvolveu muito rápido, o ponto mais alto deste tipo de construção foi a Pirâmide de Quéops.

A sociedade egípcia era constituída por um REI, que quando seus poderes enfraqueciam eram mortos ritualmente, e esse conceito se enfraqueceu durante o Primeiro Período Intermediário, a FAMÍLIA REAL, que a esposa do faraó era privilegiada perante as outras mulheres do harém, o filho mais velho por direito herdaria tudo que fosse do pai, e para manter a linhagem real era permitido o casamento entre irmãos, os ALTOS FUNCIONÁRIOS, os parentes mais próximos da realeza eram quem geralmente ocupavam esses cargos, que por sinal era hereditários, e muitos dos funcionários tinham filhas no harém, as FORÇAS ARMADAS, um exército organizado, e com carros, infantaria, exploradores e marinheiros, a carreira no exército ajudava o homem a obter uma importância. Os ESCRIBAS, para esse cargo era exigido pessoas que soubessem ler e escrever, estavam também ligados a educação, os CAMPONESES E OPERÁRIOS, e por fim os ESCRAVOS que poderiam ser comprados ou vendidos ou mesmo alugados.

Por fim, o livro é um tanto quanto difícil de se entender pois possui muitos detalhes e aborda os assuntos de uma forma diversificada, tornando o entendimento mais lento e complicado, entretanto são esses detalhes que enriquecem a obra e a difere das demais que tomam o mesmo tema como assunto principal.


Trecho Selecionado:

Nos capítulos anteriores mostramos, por vezes em traços ligeiros, a ideologia que determinou o caráter da antiga civilização egípcia. Não é possível compreender inteiramente os antigos egípcios sem um estudo, mais desenvolvido do que seria admissível oferecer aqui, das suas complexas crenças religiosas, pelo que devemos contentar- nos com o reforço do esboço em um ou dois pontos fundamentais.

Muitos investigadores que estudaram a antiga religião egípcia sujeitaram-na a um moderno exame teológico e a uma análise sistemática alheia ao seu contexto e à qual, por natureza, não pode ser submetida. O resultado foi uma exposição de conceitos confusos e contraditórios, em oposição com processos lógicos utilizados para os descrever. A concepção egípcia da realidade foi constituída através daquilo que o falecido Henri Frankfort, o mais perspicaz e simpatizante dos interpretes, definiu como “uma multiplicidade de aproximações”, em contraste com uma teoria unificada e coerente, filha o pensamento grego. A uma analogia simples e consistente, os Egípcios opunham um certo número de metáforas que surgiam de uma exuberância de imagens compreendidas através da imaginação.

O meio deve ter desempenhado um papel decisivo como molde das formas de pensamento. O Egipto é uma terra de antíteses; por toda a parte há impressionantes contrastes, mas nenhum mais forte que a distinção entre a terra negra de cultura e o deserto vermelho, entre uma vida fecunda abundante e a mais estéril desolação. Não é, portanto, surpreendente que o Egípcio tenha concebido o seu mundo como uma dualidade de oposições mantidas em equilíbrio se rompia, logo ele experimentava um desconforto mental, sentia-se em presença do mal. A sua necessidade de estabelecer compensações observa-se na simetria da sua área e arquitetura, nos paralelismos equilibrados das suas expressões literárias mais cuidadas, na criação da dualidade política das “Duas Terras”, sobretudo na sua concepção do ma’at. (V. pág. 164.)

O Egipto correspondia a um meio físico em que este equilíbrio podia ser assegurado, pois as condições naturais eram quase imutáveis. Escapou dos tremores de terra que devastaram, de tempos a tempos, o mundo egeu. Tem um clima variável, mas desconhece as tempestades. Todos os dias o Sol se ergue em glória, atravessa o claro céu e põe-se esplendorosamente. Em cada ano o rio alaga os campos com previsível regularidade e rejuvenesce a terra cansada; só o volume da inundação permanece incerto. Até o Último Período as orlas do deserto protegeram os Egípcios daquelas caprichosas ondas de invasores que alteraram, radicalmente, a história e os destinos e outros povos antigos. A infiltração de novas raças com idéias novas foi suficientemente gradual para assegurar que a cultura nativa fosse irrigada, mas não submergida, por esses contactos. Este envolvimento permitiu ao pensamento egípcio manter um satatu quo. As areias secas preservaram muito do antigo passado como uma presença dominante. Talvez não tenha sido inteiramente por acaso que o Egipto se transformou na terra tradicional da mumificação.
Nestas condições de estabilidade, a concepção de cosmos é essencialmente estática: a mudança é apenas o ritmo de algo que torna e não uma progressão. A luta entre as forças opostas torna-se convenientemente combinada. A terra pode ser queimada no Verão, mas a inundação virá. O velho rei Osíris pode morrer, todavia seu filho, o novo Hórus, reinará em seu lugar. A vitória do deus Sol é proclamada em todo o amanhecer e a sua morte ocorre ao escurecer. Os Egípcios não tiveram uma cosmogonia que lhes dissesse que no princípio os homens erraram por haverem afrontado Deus, ou que tinham, primeiro, vivido numa Idade de Ouro, de que decaíram. Muito menos tiveram qualquer idéia de um progresso para uma melhor existência material na Terra. O governo veio dos deuses que dirigiram o Egipto desde o momento da criação. Era, portanto, perfeito no início e assim permaneceu nas mãos de um deus incapaz de fazer progredir.
“Bem estimados são os homens, o gado de Deus. Deus fez o Céu e a Terra segundo os desejos deles. Aliviou a sua sede. Fez que o a trouxesse vida às suas narinas. Os homens são a imagem que saiu dos seus membros... Mas ele também matou os seus inimigos “(¹).

Assim escreveu o pai do rei Mericara referindo-se, também, a um antigo mito que ensinava que o deus Sol decidiu punir os homens pela sua insolência, mas, por fim, se apiedou deles e cedeu. A maneira de ver dos Egípcios era que, se bem estivesse na natureza do homem transgredir, contudo estava na natureza dos deuses perdoar, pois “ a sua ira se acaba num momento”. Há, assim, uma falta completa do sentido da culpa na psique egípcia e esta inquietação fundamental, que tanto forneceu à humanidade razões para o bem e para o mal, foi substituída, nos Egípcios, por outra força, a necessidade,não de se pôr bem com Deus, mas de se submeter ao sistema do ma’at, criado por Deus.

Nenhum comentário: